Entre


A invisibilidade que a arquitetura acaba adquirindo com o tempo, isto é, o modo como deixamos de perceber os ambientes que nos rodeiam, é o ponto de partida para os projetos de Tiago Giora. Mais do que criar novas formas, suas obras sublinham desenhos e estruturas já existentes nos locais onde se inscrevem. Apagamento, preenchimento, rebatimento e derramamento – de pisos, paredes, colunas, degraus – são algumas das operações utilizadas pelo artista para reconfigurar espaços, fazendo reverberar certas características e rearticulando nossa percepção sobre os lugares.
 
É o caso da instalação Fluorescentes (2009), desenvolvida para o Centro Cultural São Paulo, em que Giora estendeu até o chão o traçado formado pelas centenas de lâmpadas que iluminam o prédio, chamando a atenção para uma das marcas do local. Já na intervenção De dentro (2007), realizada no Torreão, em Porto Alegre, dois cantos da sala expositiva foram seccionados por planos de gesso, apagando parte do teto, paredes, janelas e rodapés – e, paradoxalmente, tornando mais visíveis os elementos que constituíam o espaço.
 
Procedimentos como esses também estão presentes no trabalho desenvolvido para a Casa M, em que o artista parte do desenho formado pela arquitetura interna da morada para criar uma intervenção na vitrine. Revelados pelo vidro, as paredes e o piso do café determinam o plano de gesso encobrindo parte da fachada. O título do projeto, Entre, alude à condição da vitrine de estar sempre entre um local e outro, como uma espécie de membrana que protege ao mesmo tempo em que expõe, separa ao mesmo tempo em que conecta. Também nos fala do modo como ela é envolta pela obra e, claro, da abertura da Casa M e do convite que a intervenção não deixa de significar.
 
Como em projetos anteriores, a operação de Tiago Giora absorve o lugar, tornando indiscernível o que é obra e o que é contexto – e questionando o que percebemos e o que falta ser visto. Como um convite a voltar os olhos para onde aparentemente não há nada para ver – ou para onde, há algum tempo, a vista era barrada por tapumes que encobriam memórias agora revitalizadas pelos novos usos e públicos da morada. Entre! 

* Texto publicado no periódico da Casa M / 8a Bienal do Mercosul de maio-junho de 2011, dedicado à primeira Vitrine do projeto, de autoria de Tiago Giora.

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