Carla Zaccagnini


Carla Zaccagnini lança mão dos mais variados suportes, linguagens e processos de trabalho para dar vazão aos seus projetos. Frutos de um olhar extremamente atento e questionador, eles convocam o espectador a adotar uma postura semelhante. Exigem uma observação dedicada, disposta a entrar no jogo proposto pela artista. Um bom exemplo é Percurso Ótico, desenvolvido em 2005 para a Pinacoteca do Estado de São Paulo. A intervenção consistiu na criação de um jogo de espelhos através dos quais era possível observar uma tela do acervo da instituição exposta em outro andar do prédio. Para aproximar-se do trabalho, era necessário disposição: não só para encontrar o ângulo certo de visão, mas para desvendar a maneira como a obra era simbolicamente transportada, bem como as questões conceituais envolvidas no processo.

Outro exemplo é Jogo de memória, um conjunto de 36 pequenas imagens muito semelhantes entre si. O jogo consiste em encontrar os 18 pares existentes, tarefa quase impossível, que em todo caso demanda um olhar detido e paciente. “O trabalho propõe um exercício de atenção ao qual não estamos habituados. Nas cidades de hoje, onde o que não falta são estímulos visuais, acostumamos o olho a ver cada vez menos”, analisa.

Carla costuma dizer que seus trabalhos funcionam como iscas: estímulos que provocam o espectador a se interrogar sobre o que vê e a refletir sobre determinadas questões. Dentre elas, temas como políticas de cultura e de preservação de patrimônio, aspectos que permeiam boa parte dos projetos recentemente desenvolvidos pela artista. “Especialmente no Brasil, onde as instituições de arte são bastante frágeis, é muito fácil apontar problemas. O que tento fazer é transformar esses limites e imperfeições em material de trabalho”, diz. Foi o que ela fez, por exemplo, quando criou um projeto para uma coletiva de jovens artistas brasileiros no Centro Wilfredo Lam, em Havana, 2002. A exigência era que os participantes enviassem peças somente em papel e se dispusessem a doá-las à instituição para que esta não tivesse de arcar com os altos custos de seguro e transporte das obras. Carla tomou a limitação como desafio e propôs uma solução inusitada. Fez de seu trabalho um projeto de doação de livros sobre arte brasileira à biblioteca do Centro. Permanentemente expostos, todos os exemplares foram carimbados pela artista.

A multiplicidade de Carla não se reflete apenas em sua produção. A artista, que iniciou sua trajetória inventando diferentes modos de desenhar, hoje acumula outros papéis no circuito de arte. Participa do conselho editorial da revista Número e escreve para publicações como Art Nexus e Arte y Parte. Além disso, já atuou como curadora assistente do Museu de Arte Moderna de São Paulo e recentemente integrou o grupo de curadores da exposição Farsites, parte do programa inSite_05.

* Texto originalmente publicado na revista Contemporary, em agosto de 2006.
** Bibliografia, 2002.

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